quarta-feira, 16 de novembro de 2011

O analista ou o travesseiro?


Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir

Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu

Como? se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios ainda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair

Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir.

A canção é do grande mestre Chico Buarque de Holanda (Eu te amo) já foi gravada por Zizi Possi, Fafá de Belém... E como não fui agraciado com uma voz digna de interpretá-la, ao amanhecer ouvindo-a, resolvi então lutar com as armas que tenho: analisando-a. embora eu saiba, que ninguém sou para analisar Chico Buarque, vamos brincar então de interpretar a letra.
Uma das formas mais louváveis que pode haver num artista é saber dizer aquilo que sente através da palavra. A palavra, me ensinaram os grandes, é a maior expressão da natureza de seu autor e sendo-a então, maior é a que melhor pode traduzir os nossos sentimentos, sejam eles de que natureza se apresentem diante das letras.

Falar através de metáforas, de parabólas e comparações, é uma arte muito antiga, Jesus Cristo sempre falou aos seus através de metáforas para melhor compreendermos o sentido de suas lições, e sem necessariamente escrever uma única linha, foi transladado pelos séculos afora  como o maior orador que já habitou este planeta.

A metáfora vem do grego (metaphorá) que quer dizer transporte, uma das figuras metafóricas mais interessantes de se ler é a metonímia, que aprendi quando ainda cursava o colegial. Significa usar uma parte em favor do todo. Entenderam? Não? é mais ou menos assim: eu falo de um todo, usando apenas parte desse todo, seria como generalizar, pluralizar um feito, fato ou ato, argumentando através de um único feito, fato ou ato. É o que Chico faz com essa canção. Metaforicamente, ele usa elementos como partes do corpo, para se referir aos donos dos corpos, o que faz dessa canção quase um conto erótico.

Vejamos, quando ele usa palavras como pernas, seios, mãos, cara e olhos, nada mais é que o uso de um recurso metonímico para representar (veja bem, representar!) sensações humanas. Junto à isso, ele utiliza (quase sem rimas) palavras como paletó, vestido e sapato, para através destas alegar que o casal (sujeito composto e indeterminado da oração) não se separe. 

Como podemos ver, a arte de brincar com as palavras é algo muito grande, muito poderoso, pois através destas é que formamos sentidos ao que ouvimos e lemos. Vocês já tinham analisado essa canção? Não? pois cuidado para não se contaminarem com o que escrevi (risos).

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